Quando era pequeno, gostava de passar alguns momentos das minhas Férias Grandes em casa de um vizinho do meu avô que tinha lutado na Primeira Guerra Mundial. Não sei bem porquê, mas fascinavam-me as histórias que tinha para contar. Só bem mais tarde me apercebi o quanto deve ter sido difícil a vida daquele agricultor na guerra das trincheiras.
Sempre gostei de História. Particularmente das pequenas sagas individuais daqueles que, voluntária ou involuntariamente, acabaram por fazer parte dela.
Talvez seja por isso que um determinado sítio na Internet despertou a minha curiosidade. Chama-se The Glory Days – football in times of war (http://www.cwgc.org/glorydays) e é dedicado aos futebolistas britânicos que participaram nas duas grandes guerras mundiais. O desenho do sítio merece, por si só, uma visita. Está construído e uma forma original, com jogos e informações curiosas.
Foi através deste sítio que fiquei a saber que no início da Primeira Guerra Mundial se alistaram cerca de 2.000 futebolistas britânicos. O número é espantoso, especialmente se pensarmos que no início desta guerra existiam 5.000 futebolistas profissionais na Grã-bretanha e de que o alistamento era totalmente voluntário.
A guerra de 1914-1918 tem mais histórias relacionadas com o futebol. Uma delas fala de um capitão do oitavo regimento de East Surrey que, antes de uma ofensiva na batalha do Somme, atirou quatro bolas de futebol sobre as trincheiras e prometeu uma recompensa ao primeiro soldado que marcasse um golo ao inimigo. Outra fala do clube escocês Hearts, a equipa com mais vitórias no início da época futebolística de 1914, que viu toda a sua equipa alistar-se no exército britânico. Sete destes jogadores nunca mais voltaram a jogar.
Mas talvez a mais extraordinária delas relata as tréguas do Natal de 1914. Neste ano, houve a cessação espontânea das hostilidades em inúmeros pontos da Frente Ocidental e a realização de jogos de futebol na terra de ninguém.
Mas não fiquemos a pensar que existiam apenas futebolistas de um dos lados da trincheira. No sítio oficial do Galatasaray (versão inglesa), encontrei referências a futebolistas que morreram a lutar pelo Império Otomano. São apelidados de “mártires”, um termo algo anacrónico, especialmente para nós que, estando tão habituados à paz e à segurança, o consideramos exótico e desnecessário. (Anacrónico mas não totalmente ausente do nosso meio; basta lembrarmo-nos dos “Campos Mártires da Pátria” em Lisboa.)
Em tempos de paz, talvez valha a pena recordar as Tréguas do Natal de 1914 e ler algumas histórias dos futebolistas que participaram numa guerra que ceifou, estima-se, mais de nove milhões de militares e cinco milhões de civis.
Reduzidos à razão do uniforme que envergavam, estes soldados de diferentes lados das trincheiras estavam afinal, e sem o saber, unidos pelo menos por uma paixão e um trabalho em comum: o futebol.
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